Do portal
eletrônico do conceituado Jornal O POVO, colho e comento a seguinte notícia:
“Tramita na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Senado um Projeto de Lei para incluir educação
de trânsito nas disciplinas obrigatórios do currículo escolar do ensino básico.
A proposta tem o objetivo de valorizar temas como ética, cidadania e respeito
às leis. ‘O direcionamento desses valores para o ato de dirigir veículos
automotores constituiria grande avanço na formação de cidadãos mais plenos e na
consolidação da paz no trânsito’, diz o autor do projeto, ex-senador Flávio
Arns”.
Pois bem,
deve ser meio complicado compreender como um sujeito que se mostra engajado – e
que torra a paciência alheia com um discurso chato e repetitivo sobre a
importância do capacete, do cinto de segurança, da direção defensiva etc. – um
sujeitinho que se diz sempre disposto a contribuir com um trânsito mais
humanizado e mais seguro (E QUE FALA TANTO EM EDUCAÇÃO!), não fica exultante diante da notícia acima, mas é que
sou mesmo contraditório. Nessa questão, em particular, filio-me à corrente
minoritária, pois entendo que o só fato de ter uma lei OBRIGANDO a abordar o
tema na escola NÃO acrescenta muito. O buraco é mais embaixo, é mais uma
questão de engajamento, de se perceber a importância e a urgência social, como
bem observa o sociólogo EDUARDO BIAVATI.
Penso que a
mera inserção do assunto como disciplina obrigatória não implicará,
necessariamente, no efetivo engajamento dos que fazem a escola. Cumprir a
obrigação legal, não raro é algo relativamente simples de ser feito (e, também
de ser ignorado). A chamada "municipalização" do trânsito é um
exemplo claro disso: em muitos casos, implica tão somente no cumprimento das
formalidades e na criação de alguns empregos com destinatários certos
.
Em outros, ignora-se por completo a lei e fica por isso mesmo.
A propósito
de educação para o trânsito e de leis, não custa lembrar que o art. 23 da Lei Maior
do país (CF/1988), já fixa ser competência comum da União, dos Estados,
do Distrito Federal e dos Municípios:
[...]
XII –
estabelecer e implantar política de educação para a segurança do trânsito.
Por sua vez,
o Código de Trânsito Brasileiro, Lei nº 9.503 de 1997, institui que a educação
para o trânsito será promovida na pré-escola e nas escolas de 1º, 2º e 3º
graus, por meio de planejamento e ações coordenadas entre os órgãos e entidades
do Sistema Nacional de Trânsito e de Educação, da União, dos Estados, do
Distrito Federal e dos Municípios, nas respectivas áreas de atuação (art.76).
Parágrafo
único. Para a finalidade prevista neste artigo, o Ministério da Educação e do
Desporto, mediante proposta do CONTRAN e do Conselho de Reitores das
Universidades Brasileiras, diretamente ou mediante convênio, promoverá:
I - a
adoção, em todos os níveis de ensino, de um currículo interdisciplinar com
conteúdo programático sobre segurança de trânsito;
Não
bastasse, estamos vivenciando a Década Mundial de Ação pelo Trânsito Seguro,
instituída pela Resolução A/64/255, da Organização das Nações Unidas (ONU), onde, precisamente por conta da urgência social que a questão da
violência no trânsito representa, se estabeleceu o período de 2011 a 2020 como
um decênio onde deve se dar prioridade à AÇÃO (à práxis transformadora, que se opõe ao mero discurso). Por
intermédio da citada resolução, a ONU convocou todos os países signatários –
dentre eles, o Brasil – para uma grande cruzada em prol da vida, cuja meta principal
é diminuir em 50% os acidentes de trânsito em todo o mundo.
A questão é:
se diante de tudo isso, até hoje não conseguimos colocar em prática a adoção
desse currículo interdisciplinar, resolveremos o problema da educação para o trânsito (ou da falta dela) com mais
uma lei? Por força da lei ora comentada teríamos, amanhã, a escola e os professores totalmente
envolvidos com essa causa?
Infelizmente,
respeitando muitíssimo toda e qualquer opinião divergente, este incauto
pesquisador está com os que desconfiam dessa “boa-nova”.