Jornal do Brasil, artigo de autoria de Celso Franco
Com o título “Anatomy of a Crime”, foi publicado, nos Estados Unidos, no final da década de 50, do século que passou, um romance escrito pelo promotor Robert Traver's. De tão grande sucesso, chegou ás telas de cinema, estrelado por James Stewart.
Pois bem, no dia 2 da semana que passou assisti na TV, entre incrédulo e estupefato, ao grave acidente envolvendo um ônibus que caiu de um viaduto sobre uma pista da Avenida Brasil, a mais movimentada do Rio. Felizmente, em sua queda, não atingiu nenhum outro veículo na pista. Já imaginaram se tivesse caído sobre outro ônibus?
Longe de mim me comparar ao promotor autor do livro ao qual me refiro. Mas, como analista de trânsito, tenho o dever de proceder a uma verdadeira anatomia neste, a meu ver, crime doloso.
O delegado resolveu indiciar como responsáveis por crime doloso o motorista e o passageiro que, segundo testemunhas, travavam uma discussão, tendo o motorista sido agredido. Para mim não basta. É preciso se avançar mais na dissecação deste crime, repito, doloso.
Como outro motivo da tragédia, o descaso quanto á sinalização do viaduto, no que diz respeito á sua segurança. Faltava o “guard-rail”, defensa lateral, capaz de conter qualquer veículo que com ela colida.
Embora as autoridades e técnicos recomendem a defensa de concreto, tipo New Jersey, que não divide a deformação do impacto, com o veículo, eu prefiro a metálica “Box Beam” que, amortece o choque e com ele divide os efeitos de deformação, embora não utilizada no Brasil.
E se tratando da sacrificada classe de motoristas de ônibus, já cansei de alertar as precárias condições de trabalho destes profissionais. Não têm horário para se alimentar, muito menos local para fazê-lo. Também não tem local para satisfazer suas necessidades fisiológicas.
Quanto ao horário de trabalho já sugeri que exista um cartão de ponto, onde se registraria o inicio do turno de trabalho e que viajasse com o motorista, sendo fiscalizado durante o trajeto, por agentes do governo, a exemplo dos fiscais, que havia nos bondes, para o controle da arrecadação pelos condutores.
Finalmente, estranhamente, o que no meu tempo os proprietários de ônibus desejavam, criar a matrícula do motorista no veículo, a fim de que as multas fossem pagas por eles, agora não desejam. Não sentem, os motoristas, o custo das infrações que usam e abusam de cometê-las.
O novo Código que tira pontos da carteira e pode suspender a licença de dirigir não interessa aos patrões, em face da oferta de serviço ser maior do que a procura.
Finalizando, enquanto, na contramão do mundo civilizado, o transporte público visar o lucro, quem “paga o pato” é o usuário, infelizmente, às vezes, como agora, com a própria vida
Como diria o diretor cinematográfico italiano Federico Fellini: E la nave vá.